Deu na Marie Claire de abril: garotas bem-nascidas de 7 a 10 anos são as novas habituées dos salões de beleza mais badalados de São Paulo. Incentivadas pelas mães, elas marcam hora para fazer maquiagem, depilar o buço, pintar as unhas e alisar os cabelos com chapinha. A nova mania é agendar festas pré-teens nesses salões, quando os serviços são liberados para a meninada. Um dos itens do cardápio, que sai por R$ 300 por convidada, é descansar num ofurô com pétalas de rosa e leite. Tudo para se livrar do estresse. Não é fácil a vida desses projetos de Cinderela.
Há quem ache graça de tanta precocidade e considere até dramático dedicar algumas linhas ao assunto. Eu, não. As “bonequinhas de luxo” do ano 2000, como classifica a revista, estão antecipando a adolescência num caminho sem volta. Nessa altura do campeonato, não vai ser fácil recuperar a infância e viver as experiências proporcionadas por essa fase deliciosamente irresponsável da vida. Por um motivo bem simples: as bonequinhas juram que já amadureceram seus conceitos por força dos novos hábitos. Elas não tomam sorvete nem brincam de casinha. Preferem comer grelhados com legumes cozidos no almoço e freqüentar a academia quatro vezes por semana – tudo para manter a boa forma. Como as mães, fazem questão de roupas e cosméticos de grife, e não dispensam uma severa rotina de atividades extras, que inclui natação, ginástica, vôlei e até yôga e meditação!
Na reportagem, a psicóloga entrevistada faz o alerta: vaidade em excesso numa idade tão tenra desencadeia, com freqüência, distúrbios alimentares como bulimia e anorexia. Para essas meninas com personalidade em formação, subir na balança pode significar um calvário. Um quilo a mais, o supremo castigo. O que os pais delas não entendem é que a auto-estima não se conquista em salão. Para incentivar uma criança a se valorizar, é fundamental uma formação coerente, pautada por valores mais duráveis do que algumas luzes nos cabelos.
Que fique bem claro: não sou contra os cuidados com a beleza e, para muitos, posso ser considerada até um pouco vaidosa. Mas tudo tem seu tempo. Aos 10 anos, eu brincava de queima na rua, subia em árvores e roía as unhas. Vivia com o joelho ralado e só usava roupas bacanas em ocasiões especiais – e sempre sob a orientação da mãe.
Em festas de aniversário, não me lembro de recusar cachorro-quente, brigadeiro ou guaraná. Em vez de relaxar no ofurô, eu assistia desenhos na tevê, lia livros de aventuras e inventava um milhão de brincadeiras com as minhas amigas, um programa bem mais excitante do que pedalar numa bicicleta ergométrica ou arrancar os pêlos da perna com cera quente.
É claro que as bonequinhas de luxo não podem ser responsabilizadas por essas insanidades. Nada disso seria notícia se elas não fossem financiadas pelos pais bons de grana, para os quais a felicidade é sinônimo de auto-imagem irretocável. Eles, sim, são os grandes culpados. Na ânsia de modelar potenciais Cinderelas, roubam das filhas aqueles poucos anos em que é possível curtir a vida sem agenda a cumprir, sem tendência de moda a seguir, sem matemáticas calóricas a calcular. Pobres princesas encantadas que adormeceram antes do tempo. Quem vai salvá-las nos seus castelos de areia?