Cuidado com o Pan – Texto de Fernando BH

O Pan do Brasil foi uma beleza. Arenas modernas, boa organização. Pontos negativos? Claro, vários – falar de superfaturamento é chover no molhado. Resta-nos torcer para o legado desses Jogos ser positivo. Que nenhum espaço se torne um elefante branco.

Mas minha preocupação nestas linhas é outra. É a fábrica midiática de heróis que está funcionando a todo vapor. Cada medalha resgata o orgulho de ser brasileiro? Tudo bem. Mas aproveitar que a esmagadora maioria dos telespectadores são leigos no esporte para trazer à tona ídolos não é uma boa...

Estamos a apenas um ano de Pequim e a impressão que fica é que Thiago Pereira irá faturar tudo na natação. Para se ter uma idéia, no ranking de 2007, Thiago é o 11º nos 200m peito, o 8º nos 200m costas e, um pouquinho melhor, o 4º nos 200m medley. Isto é, vai ter que dar muitas braçadas para trazer uma medalha olímpica, até porque seu maior adversário, o norte-americano Michael Plheps - o verdadeiro fenômeno das piscinas - não esteve no Rio de Janeiro. Cesar Cielo, nadador menos badalado por conseguir metade dos ouros do colega, conseguiu o segundo melhor tempo do ano nos 50m livre.

Há mais exemplos: o handebol, tanto masculino quanto feminino, já evoluiu bastante, tem atletas atuando na Europa, mas em Jogos Olímpicos tem sonho mais modesto: figurar entre os oito primeiros. O que dizer do basquete masculino, atual bicampeão pan-americano e ausente em Olimpíadas deste Atlanta-96? Argentina e EUA, forças do continente, vêm sem seus principais atletas.

E como foi patético Galvão Bueno querer atribuir importância à dupla norte-americana que enfrentou os favoritíssimos brasileiros Ricardo e Emanuel no vôlei de praia... Só porque eles resolveram engrossar o jogo. \'Haaaaaja coração\'! Eles nem participam do circuito mundial... O narrador nem precisava desse artifício, afinal, há casos (como o do vôlei de quadra também) em que somos, sim, os melhores do mundo, e devemos atropelar quem vier, seja time A, B ou c.

Como comunicador, reconheço os artifícios para seduzir a audiência, prender cada brasileiro à frente da TV, torcendo para seus novos heróis. Mas falta um pouco de responsabilidade, pois virá um possível descrédito com o desempenho bem menos empolgante que ocorrerá em Pequim. Tudo por falta de uma ressalva.

Os Estados Unidos não trazem todas as suas forças para o Pan. Desta vez, vieram mais atletas, digamos, do \'nível A\'. Mas os de \'nível B\' já dão conta de colocar o país no topo do quadro de medalhas. Tudo graças a uma base forte na formação de atletas, com bolsas universitárias e competições organizadas. No Brasil, é errado atribuir à educação física da educação básica a responsabilidade por formar atletas. Esportistas de alto rendimento são fruto de uma sociedade mais amparada. Quando o poder público oferecer melhores condições de vida aos cidadãos, as medalhas olímpicas serão conseqüência e não atos isolados de heroísmo.

E-mail: fernando_bh@yahoo.com.br

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