cotidiano – Texto de Thiago Roque

todo dia, ao lavar o rosto e a barba eternamente por fazer, lembrava do cheiro dela.
ele simplesmente não ia embora. uma, duas, três doses depois, ainda estava ali, penetrando as narinas, rasgando os sentidos.
vinho, miojo, resfenol. tentou de tudo.
tentar. verbo conjugado pelos perdedores.
às vezes, levantava da cama, todo suado, em plena madrugada. colocava o banquinho laranja na sacada, deixava escorrer uma lágrima e tentava sentir qualquer outra coisa.
olhaí o tentar novamente...
seu bosta.
até solidão resolveria.
mas não. o que vinha era aquele cheiro.
o cheiro dela.
mistura de... sabe-se lá do quê.
era dela. era ela.
ela era.
já era quase uma da tarde. e ele precisava tomar banho, colocar o jeans surrado, a camiseta verde, o all-star branco-marrom-de-sujo. tinha uma porra de vida pra viver.
tudo isso pensando nela. e no cheiro dela.
e o pior: com ela longe. bem longe.
o que era tudo isso? castigo divino? lição? maldição?
não.
só mais um dia.
que, não por acaso, até rima com sina.

E-mail: roque.thiago@hotmail.com

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