Levei um susto quando ouvi. Em plena hora de almoço, duas mulheres conversando sobre trabalho na mesa ao lado. Impossível não ouvir a conversa de vizinhos, que também nos ouvem, já que a proximidade das mesas em 99% dos restaurantes do Centro é para alcançar o máximo da capacidade de ocupação e, em conseqüência, o saldo bancário do dono do restaurante. E a privacidade que desça ralo abaixo. Também, quem mandou esperar privacidade num restaurante no Centro do Rio, na hora do almoço? Daí a conversa ter entrado pelos meus ouvidos, palavras esparsas mas nitidamente do universo empresarial.
E então eu ouvi. Foi algo como “...até setembro já podemos startar o projeto...”. Cacilda!!! Juro que ouvi. Estão startando um projeto em algum lugar aqui no Rio, mais precisamente no Centro! E para daqui a pouco,
em setembro! Mais um desastre que os cariocas vão ter que engolir sem mastigar, exatamente o que eu fiz com o peixe que eu estava degustando naquela hora, assim que ouvi a bomba. Que projeto é esse que será startado em setembro? Um boicote ao PAC? Apagão no Sudeste? O lançamento do BBB-8?
Quase perguntei à vizinha empresária um esclarecimento assim por alto, mas eu estaria confirmando minha abelhudice, confessando que ouvi o segredo delas e elas talvez tivessem que me eliminar em seguida. Fiquei na minha, e o pior, ninguém mais na mesa onde eu estava parecia ter ouvido ou, se ouviu, não deu a menor bola, porque os três continuaram a almoçar e a conversar como se nada estivesse prestes a mudar na vida da cidade. Pelo sim, pelo não, fiz o mesmo e continuei no papo.
Pobre de nós, cidadãos, que nem na hora do almoço estamos livres de conspirações, complôs e intrigas corporativas (é melhor entrar na dança e trocar empresariais por corporativas, é mais “muderno”), e quase sermos envolvidos nelas sem querer. E só por estarmos calmamente almoçando. O negócio, agora, é escolher muito bem o local da refeição, examinar a cara dos vizinhos de mesa e, ao menor sinal de conversas de trabalho, startar uma retirada estratégica e mudar de ponto. Seguro morreu de velho, uai.
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