E lá se foi, pela oitava vez, mais um par de óculos de bronze do poeta, desde que sua estátua foi posta em sossego no banco da praia de Copacabana. A ideia original era mesmo deixá-lo sossegado, mas tá difícil, sô. Dessa vez entrou em cena a cavalaria e Rin Tin Tin (desculpem-me os mais jovens que não conheceram essas figuras) na forma de um maçarico para rejuntar os novos óculos de Drummond e dificultar o nono roubo, mas nessas alturas o assunto já entrou para o folclore sinistro do cotidiano carioca.
Cada lugar tem os vândalos que cultiva. Por aqui, destruímos estátuas, pichamos prédios e deixamos um rastro de imundície por onde passamos. Em outras terras, um turco, em sinal de protesto, jogou seus sapatos no então presidente norte-americano durante uma visita deste, mas errou a pontaria nas duas vezes. (Tenho pra mim que ele foi preso justamente porque não acertou o alvo, mas deixa pra lá). Na Itália, um cidadão local atirou uma pequena réplica da Duomo de Milão no rosto de seu primeiro-ministro bufão, fazendo-o baixar hospital. Na Polônia, há poucas semanas, foi levado o letreiro metálico da entrada do ex-campo de concentração de Auschwitz, de triste memória, mas já recuperado pela polícia polonesa. E nos Estados Unidos, presidentes mal amados são abatidos a tiros. Vandalismo é o que não falta neste mundo de deus. Ou do diabo, sei lá.
Voltando às nossas esculturas, a do poeta de Itabira não foi a única a sofrer a ação de ladrões. O Manequinho, com seu pintinho funcionando como chafariz na Praia de Botafogo, um dia apareceu com o dito-cujo arrancado de sua estátua. Ô gente invejosa!... A de Zumbi, no Centro, só parou de levar pichações depois de ser monitorada por câmeras, recurso finalmente adotado para zelar pela integridade de Drummond. As estátuas de Ibraim Medina e Ari Barroso, em Copacabana e no Leme, respectivamente, também já tiveram seus óculos arrancados. Que coisa, né? Como nossos ladrões gostam de óculos! Alguns preferem as verdinhas ou as verbas de lanches de escolas públicas, mas esses malucos daqui adoram uns óculos...
Por essas e outras, não se pode mais dizer que nossos heróis e artistas foram imortalizados em estátuas. A qualquer momento eles podem desaparecer ou ter pedaços arrancados. Cruzes, parece até letra de bolero...
E-mail: anaflores.rj@terra.com.br
Tags: Ana Flores, Rio de Janeiro, Sociedade