Bem à minha frente, um rapaz de uns dezoito anos talvez e uma garota quem sabe um pouco mais nova se beijam continuamente; dois ou três passos adiante, um cara alto e loiro beija a orelha de um negro e os dois dançam ao som animado de Preta Gil; muito perto de mim, uma família que inclui uma criança de dois anos assiste ao show; as crianças se divertem, os homossexuais se divertem, os heterossexuais se divertem. Eu nunca havia ido a uma parada gay. Não por preconceito, mas apenas por questões circunstanciais. Desta vez, peguei o final do evento em Bauru. E o show também (Preta é uma ótima animadora de palco!).
E ali, em meio ao grande público, em meio à festa, não há como não se perguntar: como é que pode tanta violência contra gays? O que tanto incomoda as pessoas que se revoltam diante de uma realidade absolutamente humana? Está certo que muitas vezes somos incrivelmente surpreendidos, quando já achamos que não acontecerá mais. Aconteceu comigo mesmo. Fui usar o banheiro químico e perguntei a um garoto se ele fazia parte da fila (só havia ele naquela porta). Ele me respondeu que não, estava apenas esperando “o namorado”.
Quando eu tinha dezesseis ou dezessete anos, um amigo me convidou para ir à casa dele: não havia ninguém lá naquele momento e nós poderíamos ficar à vontade. Eu me lembro de ter passado o braço em torno do ombro dele e falado assim: “Olha, não sou a fim, veja com outra pessoa, ok?” Nossa amizade continuou como antes, sem qualquer entrave. Mas ontem, quase três décadas depois, ainda me surpreendi com a resposta do garoto: “Estou esperando meu namorado”. É uma pequena ilustração sobre as implicações que envolvem o tema. Não é fácil para alguém criado sob parâmetros de tradição católica e machista, como eu, digerir naturalmente transformações profundas como essa. É preciso um esforço extra. É preciso pensar que a roda do mundo gira. Pode-se até pensar no evangelho no qual nunca penso:
(Jo 13, 31-33a.34-35) - Assim que Judas saiu, disse Jesus: "Agora o Filho do homem foi glorificado e Deus nele. Se Deus foi glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo e o glorificará em breve. Filhinhos, só por pouco tempo estarei convosco. Eu vos dou um novo mandamento: que vos ameis uns aos outros. Assim como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros. Todos saberão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros".
Festas como a da diversidade servem também para ajudar a pessoas como eu. Não, não sou adepto de qualquer tipo de afronta aos gays. Mas preciso me policiar contra meus preconceitos. Preciso compreender a marcha da humanidade. Porque, afinal, faço parte dela. E quero conhecê-la por dentro para que eu mesmo também possa me conhecer melhor. Festas assim são necessárias para varrer o lixo do preconceito que ainda resta no íntimo da sociedade (no meu íntimo).
E é irônico lembrar que enquanto homens se beijavam na avenida Nações Unidas, homens tentavam se matar em torno do estádio Prudentão, antes do maior clássico do nosso futebol (Palmeiras x Corinthians). A festa gay foi mais civilizada do que a festa do futebol. As igrejas, os bispos evangélicos, os papas e os aiatolás precisam se preocupar mais com as torcidas organizadas e com a selvageria das ruas. Precisam deixar em paz quem só quer amar, exatamente como dizem certas linhas dos livros sagrados.
Tags: Comportamento, Religião, Sexo, Sociedade
Civilizado……kkkkkkkk?……Márcio solte sua franga….. e o texto? Fraquinho…fraquinho
Pronto, opinou o machão seguro de si.
Daqueles que precisam ridicularizar as posibilidades homoafetivas para se reafirmar como sabe-se lá o quê.
Linda e tocante sua crônica sobre a Parada Gay de Bauru. Me emocionei. Que as pessoas abram a mente pro diferente e se permitam admirar o que devia ser tão comum para todos: o amor. Parabéns pelas palavras! 🙂