Com a raiva turbinada pela bebida, decidiu botar tudo abaixo. Entrou rápido no caminhão recém-descarregado. Na mão direita, um pedaço de pau com sete pregos. Em oito minutos cravados encostou o possante em frente à igreja. Suava na testa e falava sozinho. Praguejava aquela fé das massas ardorosas.
Pé na porta, Helião interrompeu o culto com secas madeiradas nos bancos dos fiéis. Saldo: 14 pessoas feridas, inclusive o pastor. E o filho dele, de terninho claro. Fora os palavrões com ecos.
Tudo porque a mulher virou irmã.
A gota d´água para Helião foi a doação: R$ 22 mil para ajudar na construção do templo que ele ajudou a destruir. Católico não-praticante, o sogro perdoou o exagero. Ela, não.
No mesmo dia, Helião sumiu de Campo Grande. Foi em busca da asa da mãe na cidade-natal. Desapareceu por uns tempos.
Seria só o primeiro de três casamentos desfeitos por seu gênio torto. Para trás ficou um futuro promissor na fazenda do casal.
Hoje, Helião luta para pagar pensões e fornecedores.
Diz que não tolera gente falsa e banca cerveja no bar ao lado da oficina. Cabelos brancos e dentes por restaurar, ainda é chegado numa gandaia. Mas admite: com 45 anos de excessos diários, já não é assim tão viril. Meia bomba.
Pegou bronca de gente religiosa demais e acha que não tem conserto. Ajuda um tio pobre com embrulhos de carne para fazer como bife. Às vezes, compra carne de panela. Faz sua parte.
Descabeçado, tem bom coração - que, aliás, abriga algo entupido à espera de desobstrução. O médico falou para largar o álcool. Até parece: Helião vive "carcado", mas trabalha firme, sem preguiça e com planos de trocar o carro.
Chegou a ter um Kadett com teto solar, mas era dublê. Um primo investigador o livrou da gaiola certa, mas ficou sem o veículo. E o som e o estepe.
Chame Helião para um bate-papo e rirá de suas toscas tragédias. Só não o convide para rezar: ele derruba garrafas e vira o diabo com atrevidas provocações.