Dormi duas horas e meia. Das 2h30 às 5h. Levanto sentindo certa tensão junto com uma sede incomum, vou até a geladeira beber água. Mas no fundo não é isso que eu quero. Quero mesmo ligar a TV. E ligo. Igrejas e mais igrejas falando de deus e o diabo. Encerramento de programação na Cultura. Curso não sei de quê na Globo. Filmes repetidos. Entrevistas velhas. Vendas. Debates que já haviam rolado sobre as manifestações por todo o país. Afasto um pouco a cortina e olho lá fora. As luzes da rua ainda estão acesas. Há um céu incerto lá longe e uma descarga no apartamento de cima. Abro o notebook e as manchetes são as mesmas de agora há pouco. Fecho, descasco uma poncã que está passada e vai para o lixo, mijo, deito, uma rala claridade começa a se infiltrar no quarto. Boto roupa e, coisa que nunca faço, vou buscar algo pra comer aqui perto. A moça do caixa me diz bom dia com seu lindo decote antes que eu saia à rua. Um coração desenhado com o dedo enfeita o vidro embaçado do carro branco. Já em casa, um casal de pombos arrulha sobre a beirada da janela. Pra sacanear, eu os assusto com leves batidas no metal. Um olha para o outro e resolvem levantar voo. Agora o dia já amanhece. Está nublado, mas há clarões. Hoje, amanhã ou depois, o sol sempre vem. E nós sempre vamos.
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