Encontrei a árvore cujos frutos alimentam a humanidade. Está velha, mas frondosa, verde e produtiva, como sempre. Sentei-me à sua sombra e lhe perguntei sobre o calvário de sua vida, ao fornecer comida para bilhões de bocas no mundo. Ela não reclama de ter de gerar ininterruptamente, segundo após segundo. Apenas me diz que seus frutos não são distribuídos igualitariamente. Há pessoas que se satisfazem com um ou dois, enquanto outros levam milhares. Chegam até mesmo a vender seus frutos a quem não consegue ter acesso a ela.
Existem aqueles que sobem e machucam seus galhos e outros que sacodem seus ramos para derrubar o fruto. Tem ainda alguns, mais apaixonados, que desenham ou escrevem na sua casca dura. Até rede querem instalar em seu caule. “Aí, já é demais”, diz-me ela. Outro fato que a constrange é o urinar de cachorros. “Eles me confundem com poste”, justifica.
Mas a pior situação por que ela passou até hoje foi quando apareceram dois sujeitos, um portando machado e outro, a motoserra. “Tremi por inteira, pensei ser o meu fim”, conta-me. No entanto, eram apenas dois atores que foram visitá-la para filmar a propaganda de uma organização ecológica. “Refeita do susto, dei-lhes uma cesta cheia de frutos.”
Certa feita, relata-me a árvore da vida, sua sombra serviu para uma conferência de paz entre os líderes de dois países em conflito pré-beligerante. “Nunca vi tanta indignação no semblante de alguém como nos daqueles dois.” No final, após muita conversa e olhares recíprocos de ódio, resolveram selar acordo de paz entre suas nações. Assim que se levantaram para ir embora, a árvore deixou cair dois frutos, lá do último galho, um em cada cabeça. “Eles tinham de passar por algum castigo. Mas não se feriram, porque eram dois cabeças-duras, mesmo”, justifica a planta.
Depois de horas de conversa, despedi-me de nossa Grande Mãe, beijei seu tronco, guardei uma de suas folhas como lembrança e peguei três frutos frescos e maduros. Quando me encontrava a duzentos metros dela, olhei para trás e vi seu vulto portentoso ao balançar do vento. Daqui uns cinquenta anos, quero voltar a vê-la novamente, apalpar seu caule e descansar à sua sombra, se vivos ainda estivermos.
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