Cada vez tenho mais certeza de que um código de barra aparece na testa dos cidadãos brasileiros no momento em que eles se encontram na posição de consumidores. Não importa se é um empresário bem-sucedido, uma cozinheira de mão cheia, um pai admirado pelos filhos ou uma compositora de talento, todos reconhecidos em seu meio. O fato é que quando vão comprar um carro, encerrar uma conta bancária, fechar um pacote de viagem, fazer uma assinatura de TV a cabo, entrar num supermercado, adquirir tíquetes para um show ou uma partida de futebol, parece que alguma coisa muda no seu DNA, no seu rosto, no seu gestual, que logo os pilantras de plantão farejam mais um otário a ser engolido, cozidinho e bem temperado.
Perde-se a conta de episódios em que pessoas de qualquer classe, idade ou gênero são engabeladas, por minuto, neste país. Episódios às vezes inacreditáveis a olhos e ouvidos estrangeiros, quando estes mesmos não acabam entrando nas jogadas, pela facilidade encontrada por aqui, tão diferente das leis rígidas de seus países de origem. Mas o grosso mesmo está nos nascidos em terras brasileiras, afinal nisso também somos campeões mundiais, ulalá.
Cambistas, produtores e distribuidores de produtos piratas, vendedores bem treinados para seduzir o consumidor até o momento de ele fechar o negócio, mas fugindo dele quando o produto comprado não era nada daquilo que ele jurou que era, seja um plano de saúde ou um eletrodoméstico; empresários de má-fé explícita para com os usuários de sua mercadoria, sejam iogurtes ou apartamentos. Seria cansativo encher laudas e laudas de situações tão comuns ao nosso cotidiano e nenhuma seria exatamente uma novidade para ninguém, de tão habitual. Levanta o dedo quem nunca foi passado para trás numa falcatrua qualquer do dia-a-dia. Você não, baby, acabou de nascer e ainda está no berçário. Mas espera só começar a consumir leite de vaca e outros produtos industrializados...
Há saídas, claro, apesar de o bote nem sempre estar muito à vista. Olhar crítico ao que vê e ouve na publicidade, impermeabilidade a elogios exagerados a produtos de consumo, principalmente se eles vêm do vendedor; pronto contra-ataque diante de prejuízos, em forma de queixa formal ou processos, que dão trabalho e causam aborrecimentos de toda natureza, mas às vezes funcionam. E, principalmente, ouvidos moucos a modismos, do tipo daquele, por exemplo, que faz dois milhões de pessoas comprarem ou assistirem a um vídeo pirata só porque “todo mundo tá vendo, ué”. A não ser que você não ligue pro código de barra no seu DNA com a inscrição “mais um otário”.
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