Virei tia-avó. Matheus nasceu em junho, mas só fui conhecê-lo em meados de agosto, em sua terra natal, Campinas. Coincidiu de ser o dia em que ia ser vacinado com uma daquelas injeções que prometem noite em claro para toda a família, bumbum ou perna duros e doídos, um pouco de febre etc. Fiquei curiosa quando soube que ele seria vacinado numa clínica, já que os postos públicos de vacinação ofereciam o mesmo serviço. Minha sobrinha, mãe do Matheus, explicou que ela soubera no posto de saúde que a vacina de lá, gratuita, provocaria mais reação e que, se ela pudesse, deveria vaciná-lo numa clínica, pagando por uma vacina que daria muitíssimo menos desconforto para seu filhote. E ficou comprovado: por uma quantia x, nada baixa, Matheus foi vacinado, não ficou marcado, não passou a noite em claro e não teve febre. Que bom! Pena que nem todas as crianças brasileiras tenham a mesma sorte do nosso Matheus.
Porque convenhamos: seja por ignorância minha sobre o assunto ou por um raciocínio tipo dois mais dois igual a quatro, fica a pergunta que não quer calar: por que a vacina que as crianças não pagantes tomam dói mais e provoca mais desconforto do que as vacinas compradas pelas clínicas? Qual a diferença entre elas, além da de que uma é para crianças pobres e a outra para aquelas cujas famílias podem pagar por um produto diferenciado? A procedência é a mesma ou existem dois fornecedores dessas vacinas dadas por injeção? Por que o serviço público e as clínicas não podem oferecer o mesmo produto? Seria porque as clínicas ficariam às moscas? Não necessariamente. Quem preferisse (e pudesse) pagar para não enfrentar fila procuraria as clínicas, mas pelo menos haveria a boa notícia de que, pelo menos nesse setor da saúde, todas as crianças brasileiras, pagantes ou não pagantes, estariam recebendo o mesmo tratamento. Estou sonhando?
Espero que algum pediatra, algum diretor de posto médico, secretário de saúde, prefeito ou alguém do gabinete do governador esteja lendo este meu comentário para discordar de minha dedução. Que me diga que estou errada, que a pessoa que deu essa informação no posto de saúde estava mal informada (quem sabe era lobista das clínicas) ou me explique que somente nessa remessa de vacinas houve um problema qualquer que não pôde ser remediado pela saúde pública (desculpe o trocadilho) etc e tal. Como eu gostaria de estar errada e que alguém me dissesse por quê! Mas não com explicações e firulas como as que temos acompanhado nas CPIs em curso. Para usar uma palavra muito em voga, gostaria de uma explicação "transparente" sobre a diferença de vacinas.
E haja noites em claro. Porque os bumbuns dos Matheus não pagantes continuam a ser em número muito maior que os dos Matheus que podem pagar pelos pequenos confortos. E ainda não viram nada, coitados. São apenas calouros nessa guerrinha particular.