Por aí, em meio ao desatino dessas ruas caóticas, chamam-me louco. Às vezes, sentado na sarjeta ou deitado em becos, entre latas de lixo que me abrigam do frio, pego-me a pensar: será que sou mesmo louco? Seria possível à mente humana engendrar uma farsa tão perfeita? Pode haver uma circunstância mais terrível que esta e ainda assim firmar-se como inverdade? Riem-se de minha angústia os poucos dispostos a ouvir-me. Pedem-me para contar-lhes de novo minha história, depois abandonam-me sozinho à mercê do desespero sempre pronto a exigir-me refém de seu cárcere. Em meu caminho, não se podem mais contar as ocasiões em que estive perto de pôr um fim a isso tudo. Entretanto, não tive coragem no começo, e agora já acostumei-me ao confronto. Aprendi a esperar que a turbulência violenta de meus nervos se vá e deixe-me uma vez mais com o fiapo de esperança ao qual me apego para sustentar-me à vida. Sou um desgraçado, fie-se nisto quem vier a ler-me um dia. Ser humano algum deveria merecer destino semelhante, mas aqui estou, certo de minha sina e ao mesmo tempo aterrorizado diante dela. Peço-lhe: leia-me e diga-me se estou louco. (mais…)